_wendyandrade
Sep 5
8.2K
3.96%
Olha.
Voltar pro Rio.
É sempre de uma intensidade.
Que transborda.
Me afoga.
E não dá chão.
Na sexta.
Fui fotografar meus meninos.
Que encontro pelas ruas.
E antes.
Decidi comprar roupa pra eles.
Entro numa lojinha.
Simples.
Na Alfândega.
E Dona Dulce.
Preta retinta.
De 63 anos.
Me atende.
Simpática toda vida.
Sorrisão.
Gentil.
E ao sair da loja.
Ela me dá um papel.
E tinha o seguinte texto:
Estou precisando de ajuda, faço faxina, passo, lavo, por favor me ajude.
Aquilo me matou.
Dona Dulce é minha avó.
É tua avó.
Dona Dulce é a base desse Brasil desgraçado.
Ai.
Volto.
Encontro meus meninos.
E tinha um deles.
Mais agressivo.
Batia nos outros meninos.
Xingava.
Chutava o chinelo dos outros.
Sabia cantar funks proibidos.
Fazia sinal com a arma.
Sabia como manusear uma arma.
Até que uma das crianças.
Falou:
Quando tu crescer tu vai virar bandido.
Ele respondeu:
Vou mesmo.
Distribuí as camisas da seleção.
As crianças ficaram felizes.
Muito felizes!
Mas esse menino.
O mais agressivo.
Disse que não queria a camisa.
Porque se ele chegasse em casa.
Com a camisa.
A mãe dele ia brigar com ele.
E não iria acreditar que ele ganhou.
Ai.
Meu coração partiu.
Ai.
Foi que eu entendi.
Que existe uma mãe ali.
Uma mãe preocupada.
Que já leu o comportamento daquela criança.
Que está receosa.
Com medo.
Do que pode acontecer.
Que tá tentando cuidar.
Do jeito que pode.
Olha.
Provavelmente.
Uma mãe preta.
Que trabalha o dia todo.
Cuidando de uma criança branca.
Servindo gente branca.
E por necessidade.
Não tem tempo de ficar com seu filho.
Que fica solto por aí.
O dia todo.
Sujeito a violência do cotidiano.
Virando uma máquina de ódio.
Eu chorei.
Estou falando de uma criança de 7 anos de idade.
Eu fico nesse momento.
Com uma frase.
Do poema de Tatiana Nascimento.
Me dá um pedaço do teu amor?
_wendyandrade
Sep 5
8.2K
3.96%
Cost:
Manual Stats:
Include in groups:
Products:
